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26 de Abril de 2024

No futebol, o racismo continua a marcar golos

A banana comida por Dani Alves relembrou ao mundo que o racismo ainda é uma realidade quotidiana no futebol. Os estádios reflectem uma sociedade que não ultrapassou as noções de superioridade racial.

Publicado por Perfil Removido
há 10 anos

Junho de 1984. A selecção inglesa regressa do Brasil depois de ter vencido um jogo amigável por 2-0 em pleno Maracanã. No mesmo avião segue um grupo de adeptos que passam o voo a gozar com Mark Chamberlain, Viv Anderson e John Barnes, os três negros da equipa britânica. Diziam que, na verdade, a Inglaterra tinha ganho apenas por 1-0, uma vez que o golo de John Barnes – que alguns consideram um dos melhores de sempre da selecção britânica – não deveria contar.

Agosto de 1992. O holandês Aron Winter, acabado de assinar pela Lazio, é recebido em Roma com graffitti onde se diz “Vai para casa, judeu”, apesar de o seu nome do meio ser Mohammed.

Outubro de 2000. Durante o jogo para a Liga dos Campeões entre a Lazio e o Arsenal, o defesa jugoslavo Sinisa Mihajlovic chama “preto” ao francês Patrick Vieira. O jogador da Lazio admitiu o facto, com a justificação de que Vieira lhe tinha chamado de “cigano”. Dino Zoff, o treinador da equipa italiana, desvalorizou o incidente, dizendo que o que se passou entre os dois jogadores foram “coisas normais”.

Novembro de 2005. O ex-defesa do Benfica, Marco Zoro, abandona o jogo da Serie A entre a sua equipa, o Messina, e o Inter de Milão, depois de ter passado o desafio a ouvir cânticos racistas das bancadas. “Fui mal tratado e não posso aguentar”, disse o costa-marfinense.

Abril de 2014. Uma banana é atirada das bancadas durante o jogo da Liga espanhola entre o Villarreal e o Barcelona na direcção do brasileiro Dani Alves. O jogador do Barcelona apanha e come a banana, dando início a uma campanha de consciencialização que percorreu o mundo.

A estes exemplos muitos mais poderiam ser adicionados, de várias décadas e em vários países europeus, que mostram que o racismo foi e continua a ser uma realidade no futebol, seja da parte de adeptos ou de jogadores. O fenómeno, como em muitos outros casos, não é exclusivo do futebol, apenas espelhando os vícios da sociedade.

O racismo nos estádios de futebol entrou para a ordem do dia a partir dos anos 1980, quando se iniciaram algumas das primeiras campanhas levadas a cabo pela UEFA e por organizações não-governamentais. Mas, na verdade, demonstrações xenófobas são tão antigas como a própria modalidade.

Nos anos 1920, o jogador Carlos Alberto, um negro que jogava no Fluminense, tinha o hábito de passar pó talco na cara para esconder as feições mulatas, que desagradavam aos adeptos das classes altas que apoiavam a equipa carioca. Os historiadores dividem-se quanto ao facto de Carlos Alberto o ter feito de livre vontade ou se era o clube que o obrigava, mas a verdade é que até aos dias de hoje o Fluminense ainda é conhecido como o clube “pó-de-arroz”.

A história é recordada hoje como uma caricatura de uma época longínqua, em que a raça como factor de exclusão era um dado adquirido, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Quase um século depois, a escravatura foi suprimida, a Lei dos Direitos Civis de 1964 pôs fim à segregação racial nos EUA, o apartheid sul-africano foi abolido e, em 2008, Barack Obama tornou-se no primeiro presidente norte-americano não branco.

Mas há algo de perturbador nos episódios de racismo nos campos de futebol que vão sendo registados em pleno século XXI. Uma semana depois da banana de Dani Alves, o jogador senegalês do Levante, Pape Diop, passou o jogo contra o Atlético de Madrid a ouvir imitações de macacos sempre que tocava na bola. No final da partida, exasperado, Diop começou a dançar de forma provocatória a poucos metros dos adeptos rivais. “Não sei se é racismo ou falta de respeito, mas isto tem de acabar”, lamentou o jogador.

Sociedade racista, futebol racista

Acontecimentos do género não surpreendem o sociólogo Pedro de Almeida, que tem trabalhado no tema do racismo e futebol. “O paradigma racista e eurocêntrico está altamente enraizado nas sociedades europeias e o futebol é o reflexo lógico disso mesmo”, explica em conversa telefónica ao PÚBLICO.

A opinião defendida pelo doutorando do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra é a de que, nas sociedades europeias, o racismo está muito interiorizado, fruto da “ideia de superioridade da Europa em relação ao resto do mundo”. O futebol, como “palco privilegiado de afirmação de identidades locais e nacionais”, apenas “favorece o aparecimento de manifestações que designamos de extremistas”.

A mesma ideia é partilhada por Piara Powar, director-executivo da rede FARE (Football Against Racism in Europe), que diz ao PÚBLICO que “o futebol reflecte a sociedade”. Uma sociedade que, de acordo com Power, ainda não é “pós-racista”.

Fonte:http://www.público.pt/desporto/noticia/no-futeboloracismo-continuaamarcar-golos-1635152

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